sexta-feira, 8 de outubro de 2010

À espera do desabrochar



Assisti, ontem, ao novo filme Dois Irmãos, do cineasta argentino Daniel Burman, e pude compreender, de maneira muito pessoal, a trajetória do personagem Marcos. Sexagenário, solitário e solteiro, ele dedicou sua vida a cuidar de sua mãe. Com o advento de sua morte, Marcos muda de cidade e, aos poucos, rompe relações também com a sua irmã, extremamente possessiva e controladora, e sai em busca de experiências mais descomprometidas e despretensiosas, porém muito mais autênticas. É é neste exercício daquilo que lhe é próprio, que Marcos se reinventa e se redescobre. Vale a pena assistir.
Muitas vezes em minha vida também me percebi completamente voltada para o outro, para o futuro, para o devir, com a expectativa de que surgissem acontecimentos que me despertassem; como se uma varinha mágica me tocasse de alguma forma e me transportasse de meu cotidiano, muitas vezes destituído de existência, para uma outra dimensão minha.
E, sem perceber, acabava por me afastar exatamente de mim mesma.
Os ensinamentos budistas e o conhecimento advindo da tradição yóguica me ensinaram a importância de manter-me no presente, no aqui e agora. E naturalmente me conduziram por vivências em que pude estar intimamente em contato com a minha alma. E saí delas muito mais fortalecida. As práticas terapêuticas e os diversos cursos de autoconhecimento também me encorajaram no meu particular exercício de mim mesma. E, assim como o personagem Marcos, percebo hoje que é possível nutrir-me de minhas próprias experiências e que as minhas expectativas atuais partem daquilo que já existe dentro de mim. De potencialidades e habilidades pré-existentes, que em um momento possível irão surgir.
Há uma linda canção da norte-americana Norah Jones, que se intitula Turn me on, a qual não me canso de ouvir. Ao som do piano e sob uma voz melodiosa, a letra da música conta com diversos elementos para falar sobre esta expectativa intrínseca; sobre a espera por algo que promova a retomada da conexão com a vida. Diz a canção: Como uma lâmpada que ilumina um quarto escuro. Como crianças na escola que anseiam pela primavera. Como um copo aguarda cubos de gelo refrescantes. Como o deserto aguarda a chuva. Como uma flor que espera o desabrochar.

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